I Quem tem cor age:
desmistificando o racismo à brasileira
Quando a questão
do racismo no Brasil começar a sair
dos livros, artigos, dissertações e teses de pesquisadores, quando deixar de
ser problema do negro para se tornar preocupação de todas as forças e
instituições do país, quando sairmos da fase do belo discurso e das boas
intenções sem ações correspondentes, poderá dizer então
que entramos na verdadeira fase de engajamento para transformar a sociedade;
estaremos saindo do pesadelo para entrar num sonho, e do sonho para entrar numa
verdadeira esperança.[1]
No Brasil, desde os
anos 70, o Dia da Consciência Negra vem sendo comemorado no dia 20 de novembro, data
da morte de Zumbi dos Palmares, o primeiro grande símbolo da luta dos negros no
Brasil. A importância da comemoração dessa data não se limita à lembrança de um
momento histórico e fortalecimento de Zumbi como um verdadeiro herói negro no
Brasil, mas reforça a cada ano a importância de que o povo negro conquiste sua
liberdade de fato e escreva sua própria história.
Daí a importância da
apropriação de espaços e discursos acadêmicos, afinal a participação de
intelectuais nos debates sobre os rumos da sociedade brasileira é algo que vem
de longa data e a vinculação entre reflexão teórica e compromisso político é
bastante comum e, por que não dizer, interessante. No que diz respeito às
dinâmicas das relações raciais nesta sociedade de passado escravista e presente
ainda racista, opiniões diferentes e, não raras vezes, divergentes vêm sendo
construídas, mantidas e/ou reformuladas.
As relações raciais no
Brasil foram estabelecidas de maneira muito particular. Marcada pela ideia
constante de que o massivo processo de miscigenação – que caracterizou todo o
período colonial até tornar-se uma política declarada de branqueamento da
população, sobretudo por meio da imigração europeia – tornava o Brasil um país
menos racista e mais tolerante com a diversidade racial que o compunha.
acreditava-se ainda que o ideal
de democracia racial, característico do país, era uma ideologia suficientemente
forte e progressista para abrigar e proteger a mobilização política e cultural
dos negros. Apenas depois de rompida a ordem democrática, em 1964, tal crença
foi considerada uma “ilusão” e a democracia racial, um “mito”[2]
Tal argumento levou à
formação do chamado racismo à brasileira
“que percebe antes colorações do que raças, que admite a discriminação apenas
na esfera privada e difunde a universalidade das leis, que impõe a desigualdade
nas condições de vida, mas é assimilacionista no plano da cultura”[3].
Atualmente o movimento
negro acumula uma série de conquistas, mas a situação ainda está muito aquém do
que se espera e necessita para que haja, de fato, um cenário de igualdade e
democracia racial. A realização do I Quem
tem cor age: desmistificando o racismo à brasileira vem contribuir para os
debates e mobilizações para a conquista dos direitos e espaços historicamente
negados. Busca reunir intelectuais acadêmicos, intelectuais militantes,
representantes da comunidade campineira e integrantes de grupos do movimento
negro – a partir do reconhecimento da importância política de todos nesse
processo − em torno do debate público sobre as relações raciais no Brasil. Nesse
sentido, a proposta passa por fomentar o debate acerca da relação entre racismo
e conhecimento científico . Daremos espaço para diferentes áreas do
conhecimento que abordem a temática racial.
A atividade está prevista para se realizar entre os dias 12 e 29 de novembro. Na Casa do Lago.
[1] Kabengele Munanga, As facetas de
um racismo silenciado, In: Lilia
Schwarcz e Renato da Silva Queiroz (orgs.), Raça
e Diversidade, São Paulo, Edusp, 1996, p. 218-219.
[2] Antonio Sérgio
Alfredo Guimarães. Acesso de negros às universidades públicas. Cadernos de Pesquisa, n. 118, mar. 2003,
p. 247-268.
[3] Lilia Moritz Schwarcz. Nem preto
nem branco, muito pelo contrário: cor e raça na intimidade. In: Schwarcz, Lilia Moritz (Org.).
História da vida privada no Brasil: contrastes da intimidade contemporânea.